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Ensino Superior no Brasil e no Mundo

domingo, 1 de julho de 2012

Profundidade de conhecimento

Benjamin S. Bloom dividiu as possibilidades de conhecimento em três grandes domínios: cognitivo, abrangendo a aprendizagem intelectual; afetivo, abrangendo os aspectos de sensibilização e gradação de valores; psicomotor, abrangendo as habilidades de execução de tarefas que envolvem o organismo muscular. Cada um destes domínios tem diversos níveis de profundidade, sendo cada nível mais complexo e mais específico que o anterior.


No caso do Ensino Superior, é de especial interesse o domínio cognitivo. Este apresenta os seguintes níveis de profundidade quando pensamos no conhecimento a ser adquirido: Memorização (Conhecimento): memorização de fatos específicos, de padrões de procedimento e de conceitos; Compreensão: imprime significado, traduz, interpreta problemas, instruções, e os extrapola; Aplicação: utiliza o aprendizado em novas situações;  Análise: de elementos, de relações e de princípios de organização; Síntese: estabelece padrões; Avaliação: julga com base em evidência interna ou em critérios externos.




Essa classificação foi mais tarde revisada por diversos cientistas, como Lorin W. Anderson e David R. Krathwohl, co-autor do trabalho original. Essa nova classificação apresenta mudanças como, por exemplo, posicionar Síntese em um nível mais elevado do que Avaliação. No entanto, dentro do escopo deste artigo, a classificação original é suficiente para a discussão que pretendemos aqui. 


Sob esse contexto, a pergunta é qual o nível de profundidade que esperamos ser alcançado pelos alunos do Ensino Superior. Esse questionamento tem invadido de forma recorrente as discussões relacionadas às metodologias de avaliação de alunos nas Instituições de Ensino Superior (IES). A resposta mais comum é que, sem dúvida, espera-se que  o nível de profundidade seja o correspondente ao (no mínimo) da Análise. Óbvio? Nem sempre!


As experiências em sala de aula têm demonstrado que passou a existir uma grande superficialidade no conhecimento adquirido por parte dos alunos. Essa superficialidade é quantificada ao observar-se a qualidade dos trabalhos acadêmicos elaborados pelos alunos e, principalmente, ao constatar-se a grande  dificuldade dos alunos justamente quando submetidos a  exames escritos e/ou orais que envolvem questões  de níveis de profundidade mais direcionados para Análise, Síntese e Avaliação. O que fazer então? Diante desse cenário, não vejo como tomarem-se atalhos ou desvios. Penso que é preciso enfrentar a realidade de forma bem objetiva. Isso que dizer, por exemplo,  percorrer os seguintes passos elementares:


1) Estabelecer critérios claros que consigam direcionar a elaboração dos trabalhos e dos exames escritos e orais a serem aplicados aos alunos. Esses critérios devem garantir que o nível de profundidade a ser atingido seja o correspondente ao (no mínimo) da Análise. Esses critérios devem naturalmente ser informados aos alunos para que estes tenham ciência plena da expectativa a ser considerada;


2) Corrigir trabalhos e exames orais e escritos de forma cega. Isso quer dizer baseando-se exclusivamente nos critérios estabelecidos e divulgados. Não será possível considerar quaisquer subjetividades e ou individualidades com respeito aos alunos envolvidos. É preciso frisar que o resultado atingido é o que efetivamente será levado em consideração para efeito de mensuração de rendimento;


3) Os alunos que não atingirem o nível de profundidade de conhecimento esperado deverão repetir o curso/disciplina. Ou seja, não obterão a aprovação. A leniência não será aceita de forma alguma. Precisamos entender que a não-aprovação também faz parte de um processo de evolução de aprendizagem e, muitas vezes, pode inclusive despertar caminhos alternativos àquele que originalmente pensou-se como unicamente correto. Por exemplo, um aluno que tem dificuldades de aprendizagem e não obtém sucesso em uma disciplina de cálculo pode descobrir que sua vocação natural é a medicina em vez da engenharia.




Notadamente, ao seguir-se os passos acima, os índices de reprovação e de evasão (de alunos),  principalmente na rede privada, tenderão a crescer em um primeiro momento. Mas acredito que isso será um período de turbulência que terminará com a consolidação de um sistema de educação bem mais eficiente do que o existente hoje.


Parece simples, mas não é. Existem duas razões básicas para essa constatação. A primeira refere-se ao aspecto financeiro.  Muitas IES são privadas e necessitam do chamado aluno-cliente para garantir a sua sobrevivência de forma lucrativa. Para se ter uma ideia, mais de 80% das IES de nosso país são privadas. O aluno-cliente acredita que ao pagar pela mensalidade, ele está na realidade pagando por um serviço. E se ele não consegue obter sua aprovação, então é porque o serviço não foi oferecido eficientemente. O aluno-cliente entende que a solução é então procurar uma outra IES que ofereça-lhe o serviço adequadamente, ou seja, aprovando-o ao final. O que fazer? O Estado pode, por exemplo, criar políticas de incentivo (bolsas de estudo, financiamentos, subsídios, etc.) e de fiscalização (baseadas em metas) que assegurem a existência do negócio lucrativo, por parte das IES privadas, sem a deturpação do processo de avaliação, mesmo que este culmine em índices de reprovação de patamares elevados. 


A segunda razão refere-se ao aspecto político-governamental, considerando-se a projeção  interna (dentro do país)  dos Estados da Federação e, também, a projeção mundial do país. Com índices de reprovação altos, as estatísticas relacionadas ao Ensino Superior não serão "politicamente" dignas de apreciação, pois podem ser erroneamente interpretadas como resultantes da adoção de uma estratégia de educação equivocada. Sob esse contexto, o Estado deveria ter a consciência de que todo processo de melhora pode apresentar-se inicialmente doloroso e que o fim justificará os sobressaltos eventualmente existentes.


Falarei mais sobre esse assunto em postagens futuras. Nesse ínterim, sinta-se à vontade para participar dessa discussão com seus comentários. Também convido-o a assistir a essa interessante palestra de Elizabeth Gilbert: Criatividade.


Que Deus, como quer que você o conceba, te faça feliz.
   

Escrito por: Prof. Carlo Kleber.


Um comentário:

  1. O texto explica e discute a profundidade de conhecimento esperada nos alunos de Ensino Superior. De forma geral, vejo como uma orientação para que discentes e docentes possam melhor estabelecer as estratégias a serem utilizadas no processo ensino-aprendizagem.

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