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Ensino Superior no Brasil e no Mundo

sábado, 14 de julho de 2012

Carta a todos os Alunos

Ao longo de todos esses anos de prática acadêmica, me deparei com uma série de situações vividas na convivência com os meus Alunos, além de ouvir os comentários de outros Professores, profissionais imbuídos de uma das mais nobres tarefas a que pode se entregar um ser humano: participar da educação de um outro ser humano.

O Homem não é perfeito. Traz para a sala de aula todas as angústias de um dia a dia cada vez mais competitivo. Ouvi um Aluno se referir à sala de aula como um momento de relaxamento: depois de passar o dia sob a mão pesada do chefe, no seu local de trabalho, a sala de aula é um porto seguro às suas mazelas diárias. Mais do que um local de saber, é um local de lazer.

Lembrei-me da evolução dos desafios enfrentados pelos Alunos de ontem e de hoje, como encaram os tropeços. O Aluno de ontem aceitava uma reprovação com resignação. O Aluno de hoje está cada vez menos propenso a suportar um possível fracasso. - Repetir a disciplina? Não posso perder tempo e tenho que me formar porque preciso do diploma!

Ah, o Diploma! Esse obscuro objeto do desejo dos Alunos! E de muitos pais de Alunos. Uma busca frenética que até gerou uma anedota que ouvi nos corredores de uma Faculdade. Diz uma piada que corre pelas faculdades que os cursos são uma negociação entre a instituição e o Alunos para a obtenção de um diploma e que o Professor é o cara que procura atrapalhar o negócio...

O Bacharelismo, característica dos tempos em que estudar em uma Faculdade era sinônimo de status social e privilégio de poucos abastados, manteve-se vivo no imaginário do Aluno brasileiro. Obter um diploma até lhe garante cela especial em caso de prisão. E o distingue dos outros por fazer parte de uma restrita elite: os 5 a 10 % de brasileiros que concluíram um curso de nível superior.


Muitos Alunos continuam achando que a posse de um diploma por ter concluído uma faculdade garantirá sua presença no paraíso, assim como os homens-bomba acham que explodir o corpo e levar um monte de inocentes com ele garantirá uma estada no paraíso e um harém de virgens só para ele... Haja virgem no estoque dos Jardins do Éden!

Os Alunos devem estar dispostos a entender a necessidade de adquirir conhecimento, mesmo que enfrentem rotinas estressantes na vida pessoal e familiar. Não há forma de se crescer com segurança senão pela Educação. Somente o conhecimento garante um verdadeiro desenvolvimento sustentável do ser humano.

Os bens materiais podem nos ser tirados a qualquer momento: o carro, a casa, o dinheiro, dentre outros. O conhecimento, só aquele alemão pode (o Alzheimer...)

Gostaria, com essas palavras, de motivar todos os Alunos para que busquem superar os obstáculos e atingir o conhecimento pleno das capacitações a que se propõem fazer. Não encarem os Professores como ruídos de um processo de apropriação de um “canudo”: ele é a pessoa que possui coragem para estar à frente de um grupo extremamente crítico (uma turma de Alunos) e se propor a passar um pouco de experiência e informação..

Encarem os obstáculos como trampolins, os quais deverão lançá-los mais à frente no desenvolvimento de suas vidas pessoais. Não vejam os obstáculos como muros, muralhas como os existentes nas penitenciárias, cerceadores do desenvolvimento dos Alunos brasileiros.

Parafraseando o famoso filme estrelado por Sidney Poitier: ao Aluno, com carinho.

Escrito por: Prof. Luiz Augusto.

domingo, 1 de julho de 2012

Profundidade de conhecimento

Benjamin S. Bloom dividiu as possibilidades de conhecimento em três grandes domínios: cognitivo, abrangendo a aprendizagem intelectual; afetivo, abrangendo os aspectos de sensibilização e gradação de valores; psicomotor, abrangendo as habilidades de execução de tarefas que envolvem o organismo muscular. Cada um destes domínios tem diversos níveis de profundidade, sendo cada nível mais complexo e mais específico que o anterior.


No caso do Ensino Superior, é de especial interesse o domínio cognitivo. Este apresenta os seguintes níveis de profundidade quando pensamos no conhecimento a ser adquirido: Memorização (Conhecimento): memorização de fatos específicos, de padrões de procedimento e de conceitos; Compreensão: imprime significado, traduz, interpreta problemas, instruções, e os extrapola; Aplicação: utiliza o aprendizado em novas situações;  Análise: de elementos, de relações e de princípios de organização; Síntese: estabelece padrões; Avaliação: julga com base em evidência interna ou em critérios externos.




Essa classificação foi mais tarde revisada por diversos cientistas, como Lorin W. Anderson e David R. Krathwohl, co-autor do trabalho original. Essa nova classificação apresenta mudanças como, por exemplo, posicionar Síntese em um nível mais elevado do que Avaliação. No entanto, dentro do escopo deste artigo, a classificação original é suficiente para a discussão que pretendemos aqui. 


Sob esse contexto, a pergunta é qual o nível de profundidade que esperamos ser alcançado pelos alunos do Ensino Superior. Esse questionamento tem invadido de forma recorrente as discussões relacionadas às metodologias de avaliação de alunos nas Instituições de Ensino Superior (IES). A resposta mais comum é que, sem dúvida, espera-se que  o nível de profundidade seja o correspondente ao (no mínimo) da Análise. Óbvio? Nem sempre!


As experiências em sala de aula têm demonstrado que passou a existir uma grande superficialidade no conhecimento adquirido por parte dos alunos. Essa superficialidade é quantificada ao observar-se a qualidade dos trabalhos acadêmicos elaborados pelos alunos e, principalmente, ao constatar-se a grande  dificuldade dos alunos justamente quando submetidos a  exames escritos e/ou orais que envolvem questões  de níveis de profundidade mais direcionados para Análise, Síntese e Avaliação. O que fazer então? Diante desse cenário, não vejo como tomarem-se atalhos ou desvios. Penso que é preciso enfrentar a realidade de forma bem objetiva. Isso que dizer, por exemplo,  percorrer os seguintes passos elementares:


1) Estabelecer critérios claros que consigam direcionar a elaboração dos trabalhos e dos exames escritos e orais a serem aplicados aos alunos. Esses critérios devem garantir que o nível de profundidade a ser atingido seja o correspondente ao (no mínimo) da Análise. Esses critérios devem naturalmente ser informados aos alunos para que estes tenham ciência plena da expectativa a ser considerada;


2) Corrigir trabalhos e exames orais e escritos de forma cega. Isso quer dizer baseando-se exclusivamente nos critérios estabelecidos e divulgados. Não será possível considerar quaisquer subjetividades e ou individualidades com respeito aos alunos envolvidos. É preciso frisar que o resultado atingido é o que efetivamente será levado em consideração para efeito de mensuração de rendimento;


3) Os alunos que não atingirem o nível de profundidade de conhecimento esperado deverão repetir o curso/disciplina. Ou seja, não obterão a aprovação. A leniência não será aceita de forma alguma. Precisamos entender que a não-aprovação também faz parte de um processo de evolução de aprendizagem e, muitas vezes, pode inclusive despertar caminhos alternativos àquele que originalmente pensou-se como unicamente correto. Por exemplo, um aluno que tem dificuldades de aprendizagem e não obtém sucesso em uma disciplina de cálculo pode descobrir que sua vocação natural é a medicina em vez da engenharia.




Notadamente, ao seguir-se os passos acima, os índices de reprovação e de evasão (de alunos),  principalmente na rede privada, tenderão a crescer em um primeiro momento. Mas acredito que isso será um período de turbulência que terminará com a consolidação de um sistema de educação bem mais eficiente do que o existente hoje.


Parece simples, mas não é. Existem duas razões básicas para essa constatação. A primeira refere-se ao aspecto financeiro.  Muitas IES são privadas e necessitam do chamado aluno-cliente para garantir a sua sobrevivência de forma lucrativa. Para se ter uma ideia, mais de 80% das IES de nosso país são privadas. O aluno-cliente acredita que ao pagar pela mensalidade, ele está na realidade pagando por um serviço. E se ele não consegue obter sua aprovação, então é porque o serviço não foi oferecido eficientemente. O aluno-cliente entende que a solução é então procurar uma outra IES que ofereça-lhe o serviço adequadamente, ou seja, aprovando-o ao final. O que fazer? O Estado pode, por exemplo, criar políticas de incentivo (bolsas de estudo, financiamentos, subsídios, etc.) e de fiscalização (baseadas em metas) que assegurem a existência do negócio lucrativo, por parte das IES privadas, sem a deturpação do processo de avaliação, mesmo que este culmine em índices de reprovação de patamares elevados. 


A segunda razão refere-se ao aspecto político-governamental, considerando-se a projeção  interna (dentro do país)  dos Estados da Federação e, também, a projeção mundial do país. Com índices de reprovação altos, as estatísticas relacionadas ao Ensino Superior não serão "politicamente" dignas de apreciação, pois podem ser erroneamente interpretadas como resultantes da adoção de uma estratégia de educação equivocada. Sob esse contexto, o Estado deveria ter a consciência de que todo processo de melhora pode apresentar-se inicialmente doloroso e que o fim justificará os sobressaltos eventualmente existentes.


Falarei mais sobre esse assunto em postagens futuras. Nesse ínterim, sinta-se à vontade para participar dessa discussão com seus comentários. Também convido-o a assistir a essa interessante palestra de Elizabeth Gilbert: Criatividade.


Que Deus, como quer que você o conceba, te faça feliz.
   

Escrito por: Prof. Carlo Kleber.